Publicado por: . | 2 maio, 2022

UMA NOVA ERA DE AMOR – PARTE III

GÊNESE NO LAR

TV GÊNESE/FEEAK

Apresenta: 📡📲

GÊNESE NO LAR N°559

⌚ Hora 07:00 – 03 de Maio2022_Terça-feira

FONTE: Boa Nova   – Maria – H de Campos – Francisco C Xavier

👉 Facilitador: Carlos Alberto Braga Costa

👉🏼

30
MARIA


Junto da cruz, o vulto agoniado de Maria produzia dolorosa e indelével
impressão. Com o pensamento ansioso e torturado, olhos fixos no
madeiro das perfídias humanas, a ternura materna regredia ao passado em
amarguradas recordações. Ali estava, na hora extrema, o filho bem amado.


Maria deixava-se ir na corrente infinda das lembranças. Eram as
circunstâncias maravilhosas em que o nascimento de Jesus lhe fora
anunciado, a amizade de Isabel, as profecias do velho Simeão,
reconhecendo que a assistência de Deus se tornara incontestável nos
menores detalhes de sua vida. Naquele instante supremo, revia a
manjedoura, na sua beleza agreste, sentindo que a Natureza parecia
desejar redizer aos seus ouvidos o cântico de glória daquela noite
inolvidável. Através do véu espesso das lágrimas, repassou, uma por uma,
as cenas da infância do filho estremecido, observando o alarma interior
das mais doces reminiscências.
Nas menores coisas, reconhecia a intervenção da Providência celestial;
entretanto, naquela hora, seu pensamento vagava também pelo vasto mar
das mais aflitivas interrogações.
Que fizera Jesus por merecer tão amargas penas? Não o vira crescer de
sentimentos imaculados, sob o calor de seu coração? Desde os mais tenros
anos, quando o conduzia à fonte tradicional de Nazaré, observava o
carinho fraterno que dispensava a todas as criaturas. Frequentemente, ia
buscá-lo nas ruas empedradas, onde a sua palavra carinhosa consolava os
transeuntes desamparados e tristes. Viandantes misérrimos vinham a sua
casa modesta louvar o filhinho idolatrado, que sabia distribuir as bênçãos
do Céu. Com que enlevo recebia os hóspedes inesperados que suas mãos
minúsculas conduziam à carpintaria de José!… Lembrava-se bem de que,
um dia, a divina criança guiara a casa dois malfeitores publicamente
reconhecidos como ladrões do vale de Mizhep. E era de ver-se a amorosa
solicitude com que seu vulto pequenino cuidava dos desconhecidos, como
se fossem seus irmãos. Muitas vezes, comentara a excelência daquela

virtude santificada, receando pelo futuro de seu adorável filhinho.
Depois do caricioso ambiente doméstico, era a missão celestial,
dilatando-se em colheita de frutos maravilhosos. Eram paralíticos que
retomavam os movimentos da vida, cegos que se reintegravam nos
sagrados dons da vista, criaturas famintas de luz e de amor que se
saciavam na sua lição de infinita bondade.
Que profundos desígnios haviam conduzido seu filho adorado à cruz do
suplício?
Uma voz amiga lhe falava ao espírito, dizendo das determinações
insondáveis e justas de Deus, que precisam ser aceitas para a redenção
divina das criaturas. Seu coração rebentava em tempestades de lágrimas
irreprimíveis; contudo, no santuário da consciência, repetia a sua
afirmação de sincera humildade: — “Faça-se na escrava a vontade do
Senhor!”
De alma angustiada, notou que Jesus atingira o último limite dos
padecimentos inenarráveis. Alguns dos populares mais exaltados
multiplicavam as pancadas, enquanto as lanças riscavam o ar, em ameaças
audaciosas e sinistras. Ironias mordazes eram proferidas a esmo,
dilacerando-lhe a alma sensível e afetuosa.
Em meio de algumas mulheres compadecidas, que lhe acompanhavam
o angustioso transe, Maria reparou que alguém lhe pousara as mãos, de
leve, sobre os ombros.
Deparou-se-lhe a figura de João que, vencendo a pusilanimidade
criminosa em que haviam mergulhado os demais companheiros, lhe
estendia os braços amorosos e reconhecidos. Silenciosamente, o filho de
Zebedeu abraçou-se àquele triturado coração maternal. Maria deixou-se
enlaçar pelo discípulo querido e ambos, ao pé do madeiro, em gesto
súplice, buscaram ansiosamente a luz daqueles olhos misericordiosos, no
cúmulo dos tormentos. Foi aí que a fronte do divino supliciado se moveu
vagarosamente, revelando perceber a ansiedade daquelas duas almas em
extremo desalento.
— “Meu filho! Meu amado filho!… “ exclamou a mártir, em aflição
diante da serenidade daquele olhar de melancolia intraduzível.
O Cristo pareceu meditar no auge de suas dores, mas, como se quisesse
demonstrar, no instante derradeiro, a grandeza de sua coragem e a sua

perfeita comunhão com Deus, replicou com significativo movimento dos
olhos vigilantes:
— “Mãe, eis aí teu filho!.. — “ E dirigindo-se, de modo especial, com
um leve aceno, ao apóstolo, disse: — “Filho, eis aí tua mãe!”
Maria envolveu-se no véu de seu pranto doloroso, mas o grande
evangelista compreendeu que o Mestre, na sua derradeira lição, ensinava
que o amor universal era o sublime coroamento de sua obra. Entendeu
que, no futuro, a claridade do Reino de Deus revelaria aos homens a
necessidade da cessação de todo egoísmo e que, no santuário de cada
coração, deveria existir a mais abundante cota de amor, não só para o
círculo familiar, senão também para todos os necessitados do mundo, e
que no templo de cada habitação permaneceria a fraternidade real, para
que a assistência recíproca se praticasse na Terra, sem serem precisos os
edifícios exteriores, consagrados a uma solidariedade claudicante.
Por muito tempo, conservaram-se ainda ali, em preces silenciosas, até
que o Mestre, exânime, fosse arrancado à cruz, antes que a tempestade
mergulhasse a paisagem castigada de Jerusalém num dilúvio de sombras.
*
Após a separação dos discípulos, que se dispersaram por lugares
diferentes, para a difusão da Boa Nova, Maria retirou-se para a Betanéia,
onde alguns parentes mais próximos a esperavam com especial carinho.
Os anos começaram a rolar, silenciosos e tristes, para a angustiada
saudade de seu coração.
Tocada por grandes dissabores, observou que, em tempo rápido, as
lembranças do filho amado se convertiam em elementos de ásperas
discussões, entre os seus seguidores. Na Betaneia, pretendia-se manter
uma certa aristocracia espiritual, por efeito dos laços consanguíneos que
ali a prendiam, em virtude dos elos que a ligavam a José. Em Jerusalém,
digladiavam-se os cristãos e os judeus, com veemência e acrimônia. Na
Galiléia, os antigos cenáculos simples e amoráveis da Natureza estavam
tristes e desertos.
Para aquela mãe amorosa, cuja alma digna observava que o vinho
generoso de Caná se transformara no vinagre do martírio, o tempo

assinalava sempre uma saudade maior no mundo e uma esperança cada
vez mais elevada no céu.
Sua vida era uma devoção incessante ao rosário imenso da saudade, às
lembranças mais queridas. Tudo que o passado feliz edificara em seu
mundo interior revivia na tela de suas lembranças, com minúcias somente
conhecidas do amor, e lhe alimentavam a seiva da vida.
Relembrava o seu Jesus pequenino, como naquela noite de beleza
prodigiosa, em que o recebera nos braços maternais, iluminado pelo mais
doce mistério. Figurava-se-lhe escutar ainda o balido das ovelhas que
vinham, apressadas acercar-se do berço que se formara de improviso. E
aquele primeiro beijo, feito de carinho e de luz? As reminiscências
envolviam a realidade longínqua de singulares belezas para o seu coração
sensível e generoso. Em seguida, era o rio das recordações desaguando,
sem cessar, na sua alma rica de sentimentalidade e ternura. Nazaré lhe
voltava à imaginação, com as suas paisagens de felicidade e de luz. A
casa singela, a fonte amiga, a sinceridade das afeições, o lago majestoso e,
no meio de todos os detalhes, o filho adorado, trabalhando e amando, no
erguimento da mais elevada concepção de Deus, entre os homens da
Terra. De vez em quando, parecia vê-lo em seus sonhos repletos de
esperança. Jesus lhe prometia o júbilo encantador de sua presença e
participava da carícia de suas recordações.
A esse tempo, o filho de Zebedeu, tendo presentes as observações que o
Mestre lhe fizera da cruz, surgiu na Betanéia, oferecendo àquele espírito
saudoso de mãe o refúgio amoroso de sua proteção. Maria aceitou o
oferecimento, com satisfação imensa.
E João lhe contou a sua nova vida. Instalara-se definitivamente em
Éfeso, onde as idéias cristãs ganhavam terreno entre almas devotadas e
sinceras. Nunca olvidara as recomendações do Senhor e, no íntimo,
guardava aquele título de filiação como das mais altas expressões de amor
universal para com aquela que recebera o Mestre nos braços veneráveis e
carinhosos.
Maria escutava-lhe as confidências, num misto de reconhecimento e de
ventura.
João continuava a expor-lhe os seus planos mais insignificantes. Levála-
ia consigo, andariam ambos na mesma associação de interesses
espirituais. Seria seu filho desvelado, enquanto receberia de sua alma
generosa a ternura maternal, nos trabalhos do Evangelho. Demorara-se a
vir, explicava o filho de Zebedeu, porque lhe faltava uma choupana, onde
se pudessem abrigar; entretanto, um dos membros da família real de
Adiabene, convertido ao amor do Cristo, lhe doara uma casinha pobre, ao
sul de Éfeso, distando três léguas aproximadamente da cidade. A
habitação simples e pobre demorava num promontório, de onde se
avistava o mar. No alto da pequena colina, distante dos homens e no altar
imponente da Natureza, se reuniriam ambos para cultivar a lembrança
permanente de Jesus. Estabeleceriam um pouso e refúgio aos
desamparados, ensinariam as verdades do Evangelho a todos os espíritos
de boa-vontade e, como mãe e filho, iniciariam uma nova era de amor, na
comunidade universal.
Maria aceitou alegremente.
Dentro de breve tempo, instalaram-se no seio amigo da Natureza, em
frente do oceano. Éfeso ficava pouco distante; porém, todas as
adjacências se povoavam de novos núcleos de habitações alegres e
modestas. A casa de João, ao cabo de algumas semanas, se transformou
num ponto de assembléias adoráveis, onde as recordações do Messias
eram cultuadas por espíritos humildes e sinceros.
Maria externava as suas lembranças. Falava dele com maternal
enternecimento, enquanto o apóstolo comentava as verdades evangélicas,
apreciando os ensinos recebidos. Vezes inúmeras, a reunião somente
terminava noite alta, quando as estrelas tinham maior brilho. E não foi só.
Decorridos alguns meses, grandes fileiras de necessitados acorriam ao
sitio singelo e generoso. A notícia de que Maria descansava, agora, entre
eles, espalhara um clarão de esperança por todos os sofredores. Ao passo
que João pregava na cidade as verdades de Deus, ela atendia, no pobre
santuário doméstico, aos que a procuravam exibindo-lhe suas úlceras e
necessidades.
Sua choupana era, então, conhecida pelo nome de “Casa da
Santíssima”.
O fato tivera origem em certa ocasião, quando um miserável leproso,
depois de aliviado em suas chagas, lhe osculou as mãos,
reconhecidamente murmurando:

— “Senhora, sois a mãe de nosso Mestre e nossa Mãe Santíssima!”
A tradição criou raízes em todos os espíritos. Quem não lhe devia o
favor de uma palavra maternal nos momentos mais duros? E João
consolidava o conceito, acentuando que o mundo lhe seria eternamente
grato, pois fora pela sua grandeza espiritual que o Emissário de Deus
pudera penetrar a atmosfera escura e pestilenta do mundo para balsamizar
os sofrimentos da criatura. Na sua humildade sincera, Maria se esquivava
às homenagens afetuosas dos discípulos de Jesus, mas aquela confiança
filial com que lhe reclamavam a presença era para sua alma um brando e
delicioso tesouro do coração. O título de maternidade fazia vibrar em seu
espírito os cânticos mais doces. Diariamente, acorriam os desamparados,
suplicando a sua assistência espiritual. Eram velhos trôpegos e
desenganados do mundo, que lhe vinham ouvir as palavras confortadoras
e afetuosas, enfermos que invocavam a sua proteção, mães infortunadas
que pediam a bênção de seu carinho.
— “Minha mãe — dizia um dos mais aflitos — como poderei vencer as
minhas dificuldades? Sinto-me abandonado na estrada escura da vida…
Maria lhe enviava o olhar amoroso da sua bondade, deixando nele
transparecer toda a dedicação enternecida de seu espírito maternal.
— “Isso também passa! — dizia ela, carinhosamente — só o Reino de
Deus é bastante forte para nunca passar de nossas almas, como eterna
realização do amor celestial.”
Seus conceitos abrandavam a dor dos mais desesperados, desanuviavam
o pensamento obscuro dos mais acabrunhados.
A igreja de Éfeso exigia de João a mais alta expressão de sacrifício
pessoal, pelo que, com o decorrer do tempo, quase sempre Maria estava
só, quando a legião humilde dos necessitados descia o promontório
desataviado, rumo aos lares mais confortados e felizes. Os dias e as
semanas, os meses e os anos passaram incessantes, trazendo-lhe as
lembranças mais ternas. Quando sereno e azulado, o mar lhe fazia voltar à
memória o Tiberíades distante. Surpreendia no ar aqueles perfumes vagos
que enchiam a alma da tarde, quando seu filho, de quem nem um instante
se esquecia, reunindo os discípulos amados, transmitia ao coração do
povo as louçanias da Boa Nova. A velhice não lhe acarretara nem
cansaços nem amarguras. A certeza da proteção divina lhe proporcionava

ininterrupto consolo. Como quem transpõe o dia em labores honestos e
proveitosos, seu coração experimentava grato repouso, iluminado pelo
luar da esperança e pelas estrelas fulgurantes da crença imorredoura. Suas
meditações eram suaves colóquios com as reminiscências do filho muito
amado.
Súbito recebeu notícias de que um período de dolorosas perseguições se
havia aberto para todos os que fossem fiéis à doutrina do seu Jesus divino.
Alguns cristãos banidos de Roma traziam a Éfeso as tristes informações.
Em obediência aos éditos mais injustos, escravizavam-se os seguidores do
Cristo, destruíam-se-Ihes os lares, metiam-nos a ferros nas prisões.
Falava-se de festas públicas, em que seus corpos eram dados como
alimento a feras insaciáveis, em horrendos espetáculos.
Então, num crepúsculo estrelado, Maria entregou-se às orações, como
de costume, pedindo a Deus por todos aqueles que se encontrassem em
angústias do coração, por amor de seu filho.
Embora a soledade do ambiente, não se sentia só: uma como força
singular lhe banhava a alma toda. Aragens suaves sopravam do oceano,
espalhando os aromas da noite que se povoava de astros amigos e
afetuosos e, em poucos minutos, a lua plena participava, igualmente,
desse concerto de harmonia e de luz.
Enlevada nas suas meditações, Maria viu aproximar-se o vulto de um
pedinte.
— Minha mãe exclamou o recém-chegado, como tantos outros que
recorriam ao seu carinho —, venho fazer-te companhia e receber a tua
bênção.
Maternalmente, ela o convidou a entrar, impressionada com aquela voz
que lhe inspirava profunda simpatia. O peregrino lhe falou do céu,
confortando-a delicadamente. Comentou as bem-aventuranças divinas que
aguardam a todos os devotados e sinceros filhos de Deus, dando a
entender que lhe compreendia as mais ternas saudades do coração. Maria
sentiu-se empolgada por tocante surpresa. Que mendigo seria aquele que
lhe acalmava as dores secretas da alma saudosa, com bálsamos tão
dulçorosos? Nenhum lhe surgira até então para dar; era sempre para pedir
alguma coisa. No entanto, aquele viandante desconhecido lhe derramava
no íntimo as mais santas consolações. Onde ouvira noutros tempos aquela

voz meiga e carinhosa?! Que emoções eram aquelas que lhe faziam pulsar
o coração de tanta carícia? Seus olhos se umedeceram de ventura, sem
que conseguisse explicar a razão de sua terna emotividade.
Foi quando o hóspede anônimo lhe estendeu as mãos generosas e lhe
falou com profundo acento de amor:
— “Minha mãe, vem aos meus braços!”
Nesse instante, fitou as mãos nobres que se lhe ofereciam, num gesto da
mais bela ternura. Tomada de comoção profunda, viu nelas duas chagas,
como as que seu filho revelava na cruz e, instintivamente, dirigindo o
olhar ansioso para os pés do peregrino amigo, divisou também aí as
úlceras causadas pelos cravos do suplício. Não pôde mais.
Compreendendo a visita amorosa que Deus lhe enviava ao coração,
bradou com infinita alegria:
— “Meu filho! meu filho! as úlceras que te fizeram!. . .“
E precipitando-se para ele, como mãe carinhosa e desvelada, quis
certificar-se, tocando a ferida que lhe fora produzida pelo último lançaço,
perto do coração. Suas mãos ternas e solícitas o abraçaram na sombra
visitada pelo luar, procurando sofregamente a úlcera que tantas lágrimas
lhe provocara ao carinho maternal. A chaga lateral também lá estava, sob
a carícia de suas mãos. Não conseguiu dominar o seu intenso júbilo. Num
ímpeto de amor, fez um movimento para se ajoelhar. Queria abraçar-se
aos pés do seu Jesus e osculá-los com ternura. Ele, porém, levantando-a,
cercado de um halo de luz celestial, se lhe ajoelhou aos pés e, beijandolhe
as mãos, disse em carinhoso transporte:
— “Sim, minha mãe, sou eu!… Venho buscar-te, pois meu Pai quer que
sejas no meu reino a Rainha dos Anjos. .
Maria cambaleou, tomada de inexprimível ventura. Queria dizer da sua
felicidade, manifestar seu agradecimento a Deus; mas o corpo como que
se lhe paralisara, enquanto aos seus ouvidos chegavam os ecos suaves da
saudação do Anjo, qual se a entoassem mil vozes cariciosas, por entre as
harmonias do céu.
No outro dia, dois portadores humildes desciam a Éfeso, de onde
regressaram com João, para assistir aos últimos instantes daquela que lhes
era a devotada Mãe Santíssima.
Maria já não falava. Numa inolvidável expressão de serenidade, por

longas horas ainda esperou a ruptura dos derradeiros laços que a prendiam
à vida material.
*
A alvorada desdobrava o seu formoso leque de luz quando aquela alma
eleita se elevou da Terra, onde tantas vezes chorara de júbilo, de saudade
e de esperança. Não mais via seu filho bem-amado, que certamente a
esperaria, com as boas-vindas, no seu reino de amor; mas, extensas
multidões de entidades angélicas a cercavam cantando hinos de
glorificação.
Experimentando a sensação de se estar afastando do mundo, desejou
rever a Galiléia com os seus sítios preferidos. Bastou a manifestação de
sua vontade para que a conduzissem à região do lago de Genesaré, de
maravilhosa beleza. Reviu todos os quadros do apostolado de seu filho e,
só agora, observando do alto a paisagem, notava que o Tiberíades, em
seus contornos suaves, apresentava a forma quase perfeita de um alaúde.
Lembrou-se, então, de que naquele instrumento da Natureza Jesus cantara
o mais belo poema de vida e amor, em homenagem a Deus e à
humanidade. Aquelas águas mansas, filhas do Jordão marulhoso e calmo,
haviam sido as cordas sonoras do cântico evangélico.
Dulcíssimas alegrias lhe invadiam o coração e já a caravana espiritual
se dispunha a partir, quando Maria se lembrou dos discípulos perseguidos
pela crueldade do mundo e desejou abraçar os que ficariam no vale das
sombras, à espera das claridades definitivas do Reino de Deus. Emitindo
esse pensamento, imprimiu novo impulso às multidões espirituais que a
seguiam de perto. Em poucos instantes, seu olhar divisava uma cidade
soberba e maravilhosa, espalhada sobre colinas enfeitadas de carros e
monumentos que lhe provocavam assombro. Os mármores mais ricos
esplendiam nas magnificentes vias públicas, onde as liteiras patrícias
passavam sem cessar, exibindo pedrarias e peles, sustentadas por
misérrimos escravos. Mais alguns momentos e seu olhar descobria outra
multidão guardada a ferros em escuros calabouços. Penetrou os sombrios
cárceres do Esquilino, onde centenas de rostos amargurados retratavam
padecimentos atrozes. Os condenados experimentaram no coração um
consolo desconhecido.
Maria se aproximou de um a um, participou de suas angústias e orou
com as suas preces, cheias de sofrimento e confiança. Sentiu-se mãe
daquela assembléia de torturados pela injustiça do mundo. Espalhou a
claridade misericordiosa de seu espírito entre aquelas fisionomias pálidas
e tristes. Eram anciães que confiavam no Cristo, mulheres que por ele
haviam desprezado o conforto do lar, jovens que depunham no Evangelho
do Reino toda a sua esperança. Maria aliviou-lhes o coração e, antes de
partir, sinceramente desejou deixar-lhes nos espíritos abatidos uma
lembrança perene. Que possuía para lhes dar? Deveria suplicar a Deus
para eles a liberdade?! Mas, Jesus ensinara que com ele todo jugo é suave
e todo fardo seria leve, parecendo-lhe melhor a escravidão com Deus do
que a falsa liberdade nos desvãos do mundo. Recordou que seu filho
deixara a força da oração como um poder incontrastável entre os
discípulos amados. Então, rogou ao Céu que lhe desse a possibilidade de
deixar entre os cristãos oprimidos a força da alegria. Foi quando,
aproximando-se de uma jovem encarcerada, de rosto descarnado e
macilento, lhe disse ao ouvido:
— “Canta, minha filha! Tenhamos bom ânimo!… Convertamos as
nossas dores da Terra em alegrias para o Céu!..
A triste prisioneira nunca saberia compreender o porquê da emotividade
que lhe fez vibrar subitamente o coração. De olhos extáticos,
contemplando o firmamento luminoso, através das grades poderosas,
ignorando a razão de sua alegria, cantou um hino de profundo e
enternecido amor a Jesus, em que traduzia sua gratidão pelas dores que
lhe eram enviadas, transformando todas as suas amarguras em
consoladoras rimas de júbilo e esperança. Daí a instantes, seu canto
melodioso era acompanhado pelas centenas de vozes dos que choravam
no cárcere, aguardando o glorioso testemunho.
Logo, a caravana majestosa conduziu ao Reino do Mestre a bendita
entre as mulheres e, desde esse dia, nos tormentos mais duros, os
discípulos de Jesus têm cantado na Terra, exprimindo o seu bom ânimo e
a sua alegria, guardando a suave herança de nossa Mãe Santíssima.
Por essa razão, irmãos meus, quando ouvirdes o cântico nos templos
das diversas famílias religiosas do Cristianismo, não vos esqueçais de
fazer no coração um brando silêncio, para que a Rosa Mística de Nazaré
espalhe aí o seu perfume!

Boa Nova – Maria – H de Campos – Francisco C Xavier


Respostas

  1. Divina mensagem com uma era de esperança e paz!


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